HISTÓRIAS EXTRAORDINÁRIAS APOSTARAM NA MATEMÁTICA.
COMO AS HISTÓRIAS EXTRAORDINÁRIAS DE OUSADIA E AVENTURA APOSTARAM NA MATEMÁTICA DE UM CIENTISTA DE ALEXANDRIA
Por Job Tolentino Junior
Querido Leitor,
Saiba que o planeta Terra é um lugar que possui características extraordinárias, entre estas temos: céus azuis de nitrogênio, vastos oceanos de água líquida, tépidas coberturas florestais e prados macios. Este é um mundo borbulhante de vida, dolorosamente belo e raro, e onde sabemos, único. Existe uma enorme probabilidade de que haja muitos outros mundos similares, espalhados pela galáxia. Mas a nosso entendimento sobre o nosso lindo planeta azul começou há muitos milhares de anos, e foi acumulada por homens e mulheres da nossa espécie, e guardada com muito custo através de milhares de anos.
Somos, portanto, privilegiados em viver entre pessoas brilhantes e apaixonadamente inquiridoras, e em um momento histórico em que a procura do saber é, em geral, recompensada.
A descoberta de que a Terra era um mundo finito foi feito como tantas outras descobertas importantes, no antigo Oriente Próximo, em um tempo que alguns seres humanos chamam de século III A.C., na grande metrópole da época, a cidade egípcia de Alexandria.
Nesta cidade vivia um homem chamado Eratóstenes (276–194 A.C.). Foi um de seus contemporâneos certamente invejoso, que o chamou de “Beta”, a segunda letra do alfabeto grego porque, segundo este invejoso, Eratóstenes era o segundo melhor do mundo em tudo. Mas o que a história mostra que em quase tudo Eratóstenes era “Alfa”, pois ele foi astrônomo, historiador, geógrafo, filósofo, poeta, crítico de teatro e matemático. Os temas dos seus livros abrangem de Astronomia até sobre o Alívio da Dor.
Ele foi também o diretor da grande biblioteca de Alexandria onde certa vez leu em um papiro algo que despertou sua curiosidade e interesse. Lá estava escrito que na fronteira avançada ao sul de Siena (atualmente Assuã) (fig.1), próximo à primeira catarata do rio Nilo, exatamente ao meio-dia do dia 21 de junho (solstício de verão), um conjunto de varetas retas posicionadas de modo vertical não produziam sombras. Isso significa que no solstício de verão, o dia mais longo do ano, à medida que as horas avançavam para o meio-dia, as sombras produzidas pelas colunas do templo diminuíam de tamanho, até que ao meio-dia elas não existiam mais. E que um reflexo do Sol podia, então, ser visto na água, no fundo de um poço (fig.2). Ou seja, o Sol estava posicionado diretamente sobre as cabeças de quem ali estava.
Esta foi uma observação que passaria despercebida por qualquer outra pessoa facilmente, e certamente ignorada.
Quando imaginamos varetas, sombras, reflexos em poços, posição do Sol, podemos nos perguntar que importância poderiam ter esse conjunto de simples acontecimentos diários?
Mas Eratóstenes era um cientista, e suas reflexões sobre estes lugares-comuns mudaram o mundo, e de certo modo, moldaram o mundo. Ele teve a presença de espírito de idealizar, planejar, e fazer um experimento, e então observar realmente se em Alexandria varetas retas e verticais lançavam sombra próximo ao meio-dia de 21 de junho. E descobriu que sim.
Eratóstenes perguntou então a si mesmo como uma vareta posicionada na cidade de Siena em um determinado dia do ano não lançava sombra, e simultaneamente em Alexandria, mais ao norte, lançava uma sombra pronunciada. Se considerarmos um mapa do antigo Egito com duas varetas retas e verticais, de igual comprimento, uma em Alexandria e a outra em Siena. Se supormos que, em um dado momento, cada vareta não lance nenhuma sombra. Isto é perfeitamente compreensível, admitindo-se a Terra como plana.
Se supormos que o Sol esteja posicionado diretamente sobre nossas cabeças, e as duas varetas lançam sombras de igual comprimento, isto também faz sentido em uma Terra plana. Pois os raios do Sol estão inclinados no mesmo ângulo em relação às duas varetas. Mas, o que existiria de anormal nesta abordagem capaz de fazer com que, no mesmo momento, não houvesse sombra em Siena e sim em Alexandria? (fig.1)
Após muito refletir, ele concluiu que a única resposta possível a esta pergunta era que a superfície da Terra só poderia ser curva. Mas não somente isto: quanto maior fosse a curvatura, maior seria a diferença no comprimento das sombras. O Sol, portanto, só pode estar tão distante que os seus raios são paralelos quando chegam à Terra, e as varetas estão posicionadas em ângulos diferentes em relação aos raios do Sol, produzindo distintos comprimentos de sombras. A distância entre as cidades de Alexandria e Siena deveria ser, portanto, de sete graus ao longo da superfície da Terra. Se imaginarmos que as varetas estão colocadas em linha até o centro da Terra, lá elas se interceptariam em um ângulo de sete graus (fig.3). Estes sete graus correspondem mais ou menos a um quinquagésimo de trezentos e sessenta graus, que é a circunferência completa da Terra.
Eratóstenes sabia que a distância entre Alexandria e Siena era de aproximadamente 800 quilômetros. Vocês podem se perguntar: como ele sabia disso? Bem, ele pagou a um homem para medir esta distância em passos. E o resultado foi de oitocentos quilômetros. Se multiplicarmos oitocentos por 50 obtemos 40.000 quilômetros (fig.4). Este valor, portanto, devia ser o valor da circunferência da Terra.
Os únicos instrumentos que Eratóstenes tinha na época eram: varetas, olhos, pés e cérebro, além de uma forte inclinação para conceber e realizar experiências. Com estes instrumentos ele conseguiu deduzir a circunferência da Terra com um erro associado de poucos por cento. E isso é um feito notável pois foi feito há 2.200 anos. Ele foi a primeira pessoa a medir com precisão o tamanho do planeta.
O mundo Mediterrâneo naquela época era famoso pelo volume de suas navegações, e a cidade de Alexandria era na época o maior porto marítimo do planeta na época. Uma vez cientes que a Terra era uma esfera de diâmetro modesto, não nos sentiríamos tentados a fazer outras viagens de exploração, e quem sabe procurar terras ainda não descobertas, e tentar talvez até navegar em torno do planeta? Sabe-se que centenas de anos antes de Eratóstenes, a África foi circunavegada por embarcações fenícias que estavam a serviço do Faraó egípcio Necho. Estes partiam, muito provavelmente em barcos abertos e frágeis, do Mar Vermelho, e desciam pela costa leste da África, subindo pelo Atlântico e retornando através do mar Mediterrâneo. Estas viagens épicas duravam três anos. Ou seja, tanto tempo quanto as modernas naves espaciais (tais como “Voyager”, ou a “New Horizon”) levam para voar da Terra a Saturno.
Após a descoberta de Eratóstenes, uma era de grandes viagens teve início, levada a cabo por bravos e ousados marinheiros. Seus navios eram pequenos e possuíam apenas alguns instrumentos de navegação rudimentares. E estes utilizavam cálculos precisos e seguiam as linhas da costa tanto quanto fosse possível. Quando estes estavam navegando por um oceano desconhecido, eles podiam determinar sua latitude, mas não a longitude, observando, noite após noite, a posição das constelações em relação ao horizonte, onde as constelações familiares surgiam no centro de um oceano inexplorado para tranquilizar a todos.
As estrelas eram, portanto, as melhores amigas dos exploradores que estavam em embarcações navegando pelos mares da Terra, e atualmente em aeronaves pelo céu. Após Eratóstenes, alguns navegadores devem ter tentado, mas, ninguém, antes de Fernão de Magalhães, conseguiu completar uma viagem de circunavegação da Terra. Que conjunto de histórias extraordinárias de ousadia e aventura devem ter sido relatadas no início, enquanto os marinheiros e navegadores, homens engajados no trabalho do mundo, apostavam suas vidas na matemática de um cientista de Alexandria.
PS: Podemos explicar muito mais. Descubra aqui em EDUCAPES: (http://educapes.capes.gov.br/handle/capes/599315)