Quando éramos apenas adversários.
Por Marco Aurélio Borges Costa
Não me lembro de ter escrito para a Sete Dias antes, por mais conectado que esteja com a revista faz tantos anos, como cachoeirense bastante presente na vida da cidade. A sugestão de meu amigo Leverson Freitas para essa possível estreia foi de que eu tratasse de política, assunto que nos aproximou, porém, do qual não ando muito afeito a comentar nos últimos meses.
Me lembro de quando era jovem, de ouvir nosso Ferração dizer em alto e bom som no auge das disputas que não tinha inimigos e sim adversários. Essa frase sempre ecoou para mim como um mantra, de absoluta coerência. Hoje, como praticante da Nobre Arte – o Boxe – é comum após os sparings abraçar carinhosamente aquele que nos minutos anteriores deixou meu olho roxo ou alguma costela dolorida. Porque sim, durante os três minutos do round tenho um adversário, mas longe de ser meu inimigo, é meu companheiro de treinos e amigo.
Lá nos tempos da Rádio Difusora recordo de um inusitado programa que era apresentado por Jathir Moreira, na época um tucano liderança local do PSDB; e nosso Almir Forte, ícone dos comunistas de Cachoeiro. E era um programa bem divertido, embora os dois fossem péssimos com os microfones.
De uns tempos para cá as coisas ficaram um tanto agressivas. Não raro me sinto bastante ofendido com algumas falas direcionadas á tal da “esquerda”. Longe de ficar a remontar a origem histórica do termo, a palavra “esquerda” ainda resiste identificando um conjunto de correntes de pensamento que, embora variadas e heterogêneas, se sustentam em teorias muito bem elaboradas sobre a economia, o Estado, o governo, a vida social e a vida humana em geral. E sim, eu me identifico nesse campo do pensamento. E me surpreende que algumas pessoas supostamente “bem-informadas” sejam capturadas pelo canto fácil da sereia de proferir barbaridades sem conhecimento de causa. Impressionante como simplismo encanta. E, nesse caso, a demonização da esquerda vai de uma vociferação estomacal até uma estratégia de campanha populista típica de quem nada tem a dizer.
Esse quadro atual do debate público contribui bastante para a minha desmotivação. Não tenho paciência para debates óbvios e nem para perder tempo com pessoas que só querem soltar seus demônios interiores sem a menor intenção de construir qualquer coisa. Essas pessoas deviam procurar uma terapia, não a vida política.
Gostaria de acreditar que as coisas seriam diferentes. Mas nesse ano, ao menos, duvido muito. O atual presidente, indivíduo vazio de conteúdo, escora-se na verborragia vomitando asneiras o tempo todo e motivando seu séquito com discursos fáceis de absorver e reproduzir. Estimula o ódio e motiva seus seguidores a tratar as pessoas que pensam diferente como um inimigo a se exterminar. Faz campanha mobilizando as piores emoções que um ser humano pode cultivar. E faz isso porque, não é difícil perceber, está ele mesmo infestado por essas emoções podres.
É fato que a história política do Brasil é repleta de violência. E isso não está lá tão longe. Muita gente se surpreende quando cito o episódio evolvendo o pai do ex-presidente Fernando Collor, que matou um colega dentro do Congresso (o cara errado inclusive). Com a redemocratização as coisas se acalmaram um pouco e a maior agressão de uma campanha eleitoral era uma bolinha de papel na cabeça do José Serra. O estímulo da violência nas campanhas eleitorais está voltando, e não raro atinge seus próprios porta vozes, como no caso da fatídica facada no atual ocupante do Planalto.
Portanto, meu caro Leverson Freitas, terei prazer em escrever para essa revista. Mas sobre temas menos desgastantes. Com o tempo, quem sabe voltemos aos tempos em que éramos apenas adversários. E espero que aqueles que pensam diferente desse pobre professor, que não desejem seu extermínio. Compreendam, apenas, que não somos, nenhum de nós, donos de qualquer verdade, se é que alguma verdade há para se titular a propriedade.